sexta-feira, março 16

Algés

A oficina ficava perto da estação de comboio. De manhã, ele abria com as suas mãos de quatro dedos, as portas azuis, que deixavam cair mais umas escamas de tinta na calçada. Varria as aparas de madeira e trazia as cadeiras envernizadas para o alpendre. Ficava uns instantes à porta e acenava ao cigano que no Inverno vendia chapéus de chuva à entrada do túnel para a estação. No Verão vendia bóias e chapéus de sol. Adeus Alfredo, dizia-lhe. O cigano sorria e respondia. Já aí vou. O marceneiro ficava uns instantes à porta, a ver as pessoas a entrarem apressadas no túnel da estação. De onde se ouvia a musica desafinada do cego do acordeão. Os dias delas corriam mais depressa que os seus. Que se arrastavam por entre o cheiro pegajoso de verniz e as aparas que se acumulavam lentas, no chão da oficina. Depois do último comboio da manhã o cigano chamava-o à porta com duas cervejas na mão. Sentavam-se nas cadeiras do alpendre, bebendo as cervejas pelo gargalo. Em silêncio. Até que o marceneiro apontava para a marisqueira do outro lado da rua e dizia-lhe. Quando vender uma mobília de quarto pago a uma mulher e vou ali jantar. Nunca comi lagosta, nem sei a que sabe, dizia-lhe o cigano. O marceneiro suspirava e punha a garrafa vazia debaixo da cadeira. E eu ainda não sei a que sabe o corpo de uma mulher.

(Deserto do Mundo, 26/10/2010)

Hoje, enquanto compilava os textos do Deserto do Mundo para o encerrar, lembrei-me do sabor do chocolate branco da minha infância. E lembrei-me da estação de comboio de Algés em frente à praça. Havia gente e cheiro a fruta nas bancas. E havia eu, de olhos derretidos no chocolate que comia.



Queques de chocolate branco e framboesa






125g de manteiga sem sal
100 de açucar
2 ovos inteiros
225g de farinha sem fermento
1 colher de chá de fermento em pó
pitada de sal fino
2 colheres de sopa de leite
1 colher de chá de baunilha
100 de chocolate branco partido em pedacinhos
doce de framboesa

Pré-aqueça o forno a 180º. Bata a manteiga com o açúcar até ficar bem cremoso. Junte os ovos e misture bem. Junte o leite e a baunilha e o chocolate branco.Adicione cuidadosamente a farinha previamente misturada com o fermento e com o sal. Coloque um caixinha de papel e cada uma das forminhas de queque e encha até 2/3 com  massa. Deite uma colher de chá de doce de framboesa ( de preferência com pouco açúcar) e com um palito marmoreie a superfície. Leve ao forno durante cerca de 20 minutos.

11 comentários:

CF disse...

:) Lembro-me tão bem deste...

Susana disse...

Uns queques que devem ser uma delicia! Gostei imenso do aspeto deles :) apetece ir já a correr para a cozinha.

Beijinhos

Luisa Alexandra disse...

Que óptimo aspecto, uma deliciosa sugestão para o fim-de-semana que se aproxima

mfc disse...

Uma história triste magistralmente desenrolada e apresentada!
Admiro-te o poder de síntese deste mini contos... onde nada falta, onde está tudo lá.
Beijos.

Claudia Sousa Dias disse...

não sei de quem tenho mais pena: se d cigano, se do funcionário dos caminhos-de-ferro...


:-d

Claudia Sousa Dias disse...

do marceneiro, digo.

Babette disse...

Uma história e uma receita doce. Um bom início de fim-de-semana. Só por isso.
Babette

Unknown disse...

Cristina, fabuloso.
Leio-te há meia dúzia de semanas. E dia após dia este é cada vez mais um dos meus blogs favoritos.

Anónimo disse...

História amarga com palavras doces, como desde sempre nos habituou.
Bem haja!

Mar Arável disse...

Há dias assim

com palavras belas
de chocolate negro

Laura Ferreira disse...

Eu lembro-me bem deste...