Páginas

segunda-feira, fevereiro 25

O Esteves sem metafísica - Tabacaria (II)


Comprava o jornal todos os Domingos. O Dono da Tabacaria não fechava ao sétimo dia. Vens comigo à missa? Perguntava-lhe a mulher. Não. Vou buscar o jornal. Ela ficava ali, de véu quase branco rolando entre as mãos. Fazia-te bem homem. Quando morrer ajusto as minhas contas com Ele. E o véu rolando entre as mãos era guardado na mala com um suspiro. Fazia-te bem homem. Não gostava de ler. As letras miúdas do jornal ardiam-lhe na vista a pedir óculos há muito. Por isso não havia livros em casa. Só a Bíblia, que a mulher lia todas as noites antes de dormir. Depois, pousava-a na mesa-de-cabeceira, benzia-se duas vezes, três se visse que ele estava com ardores e punha o lenço de cambraia para não estragar o apanhado de cabelo, sempre impecável. Tenho saudade de te ver com o cabelo caído, dizia-lhe ele quase sorrindo. Ela nem levantava os olhos do terço que corria lesto e rotineiro por entre os dedos ásperos da cinza. Não gostava de ler. É o jornal, Esteves? O Dono da Tabacaria guardava-lho por debaixo do balcão. À porta estava a rapariga dos chocolates, sem nome e olhos vagos. Ficava ali, à porta, a olhar para a Mansarda. Deixou a moeda no balcão. Só lia a página dos mortos. Para saber quem ia e quem ficava. Sempre que podia ia aos funerais, mesmo que não conhecesse o defunto. Mais triste que a solidão em vida, é a solidão da morte. Por isso cumprimentava toda a gente. Talvez assim não se esquecessem do seu enterro. O pai, que morrera fulminado por um ataque de fúria, não tivera ninguém para além dele e da mãe. Que o coveiro e o padre não contam. Por isso ia a todos os enterros que podia. Devias ter ido hoje comigo, dizia-lhe a mulher sentada à beira da cama enquanto atava o lenço. Foi bonito o sermão. Ele olhava-a. Tenho saudades do teu cabelo. Fazia-te bem homem. Ele aconchegava-se na cama. Foi alguém a enterrar hoje? Perguntava-lhe a mulher. Foi. As pessoas eram tantas que ficaram à porta do cemitério. Ela suspirou. Um homem de Deus. Não, retorquia ele enquanto apagava o candeeiro a petróleo. Um homem de bem.


Tarte de dois chocolates com molho de café



4 gemas
7 claras
1 tablete de chocolate preto
1 tablete de chocolate branco
125g de açúcar
75g de manteiga
100 ml de natas
6 folhas de gelatina
200g de bolachas de chocolate
80 g de manteiga derretida.

Demolhe as folhas de gelatina em água fria.Derreta o chocolate preto com a manteiga, em banho maria, junte a esta mistura metade das folhas de gelatina e envolva bem. Bata as gemas com o açúcar e misture o chocolate derretido. Bata as claras em castelo e adicione à mistura, metade das claras, envolvendo cuidadosamente. Leve ao frio para prender um pouco.
Derreta o chocolate branco com as natas em banho maria, junte as restantes folhas de gelatina e envolva as restantes claras.
Pique as bolachas de chocolate e junte a manteiga até obter uma pasta areada. Forre o fundo de uma forma de mola com esta mistura. Deite por cima a mousse de chocolate preto e depois a mousse de chocolate branco. Leve ao frio por umas horas.

Molho de café

300ml de café expresso forte
100ml de água
100g de açúcar

Leve o café, a água e o açúcar num tachinho ao lume e deixe ferver em lume brando até reduzir para 1/3 do inicial.


Sirva a tarte com o molho de café




11 comentários:

  1. Partilhando Sabores e Receitas25 de fevereiro de 2013 às 13:55

    Que tentação! Uma tarte muito gulosa sem dúvida.

    ResponderEliminar
  2. que aspecto... não sei se babe pelos 2 chocolates se pelo molho de café hmm

    ResponderEliminar
  3. AHAAAAAAAAAAA babei, apetece roubar do ecrã e tricar :)

    ResponderEliminar
  4. A personagem do valter em "a máquina de fazer espanhóis" e antes de Fernando Pessa, no poema "A Tabacaria".

    ResponderEliminar
  5. Sim, Claudia. O Esteves sem metafísica, saído da Tabacaria de Álvaro de Campos. Este texto, foi um de 3 (a pequena dos chocolates, já publicada em baixo) que escrevi para o espectáculo de dança e teatro, que se realizou no Festival do Chocolate de Óbidos, o ano passado.
    bjs

    ResponderEliminar
  6. Humm.. que bela delícia!
    beijinhos
    http://sudelicia.blogspot.pt/

    ResponderEliminar
  7. Gosto da história, gosto da tarte, gosto da fotografia... :) gosto de tudo.

    beijinhos

    ResponderEliminar
  8. Que linda!! Acho que vou levar a receita para os anos do meu irmão!
    Beijinhos e boa semana!

    ResponderEliminar
  9. Simplesmente adoro Álvaro de Campos! Fantástico mesmo! E esta tarte? Bem... Simplesmente sublime! A foto convida a meter o garfinho!!
    Beijinhos

    ResponderEliminar