No terceiro andar vivia uma mulher com dois filhos. Um rosto
quase bonito, quase sem idade que emoldurava uma voz quase doce. Que se arrastava num
quase murmúrio pelos lances de escadas, deixando o perfume caro a impregnar as
paredes cobertas de minúsculos vidros coloridos. Estas paredes parecem de
papel, ouve-se tudo, dizia se alguma conversa de vizinhança se prolongava entre
os andares. Os vizinhos encolhiam os ombros com ironia, e perguntavam-lhe pelo
marido que nunca viam, só ouviam às sextas-feiras à noite. Trabalha no Porto,
coitado. Só pode vir a casa ao fim de semana, respondia mesmo sabendo que eles
lhe ouviam os gritos e os choros de domingo de madrugada e lhe olhavam para as
mãos sem aliança. É uma canseira, esta vida, dizia enquanto pousava os sacos
das compras de onde rebolavam sempre maracujás engelhados e castanhos. Ele
adora maracujá. É a única fruta que come. Os vizinhos sorriam de novo e ela
repetia em tom de justificação. Mas estas paredes são de papel. Ouve-se tudo. Depois
pegava nos sacos e os vizinhos ficavam a ouvir a porta do terceiro a andar
abrir-se. A mesma que se fechava abruptamente todos os domingos de madrugada
depois dos gritos, deixando um rasto de maracujá e soluços atrás dos passos.
Que desciam as escadas de dois em dois degraus, assobiando uma marcha nupcial
que nunca acontecia.
Tartes de maracujá
1 receita de massa quebrada ou uma embalagem de massa
quebrada
350 g de polpa de marcujá
1 lata de leite condensado
3 gemas
3 gemas
Açucar mascavado
Forre forminhas de tarte com a massa quebrada. Leve a forno
pré-aquecido a 180º, cobertas por papel vegetal e grão de bico ( ou contas de
porcelana) , durante 15 minutos. Entretanto leve ao lume o leite condensado com
a polpa de maracujá e as gemas até fazer ponto de estrada. Deite sobre as tartes já arrefecidas.
Quando o recheio estiver frio, polvilhe com o açúcar mascavado e queime com um
maçarico ou ferro de leite creme.