segunda-feira, novembro 7

Port de bras

Ao cimo das escadas em caracol havia uma sala, submersa na luz trémula e amarela que era coada pelos vidros martelados da janela. Nessa sala habitavam duas mulheres. Uma cujos os olhos só se iluminavam quando dançava, de braços tão esguios que apanhavam a música que escorria para os cantos da sala. Outra de cabelos ruivos e crespos e rosto quase invisível, porque dela só me lembro das mãos e dos sapatos velhos de atacadores sobre os pedais. A um gesto surdo da mulher dos braços esguios ela deixava cair os dedos sobre o piano e a luz deixava de ser trémula e ganhava a liquidez dos acordes. Ao cimo das escadas em caracol havia uma sala e duas mulheres. E muitos corpos, mornos, ainda sem formas, vestidos com maillots azuis. Corpos alinhados, ao longo de uma barra de madeira, tentando com os dedos ainda curtos da infância apanhar a música que lhes escorria pelos gestos. E havia a voz da mulher de braços esguios, que voava. Naquele tempo, parecia-me que ela podia voar, que voar é tudo o que fazemos para além de nós. Cerrava os olhos e imaginava que os meus braços, as minhas pernas, os meus medos perdiam o peso que os prendiam ao soalho empoeirado, e as dores dos músculos que se queriam ainda pequenos tornavam-se círculos e semicírculos cujos nomes a mulher de braços esguios soprava numa língua doce com sabor de poesia. Ao cimo das escadas em caracol havia uma sala, e havia eu, de braços curtos que só cresceram depois das palavras, das minhas palavras, que se dobraram no espaço para que eu pudesse dançar.



Tanto a historia de Ler, como a de Comer de hoje foram contadas na abertura da escola de Dança e Artes de Óbidos. Uma quase memória oferecida à equipa que tornou possível esta escola. Bem hajam!





Pavlova com lemon curd e frutos do bosque



10 claras à temperatura ambiente
350 gramas de açúcar granulado fino
1 colher de sopa de maizena
1 colher de sobremesa de vinagre de vinho branco
2 colheres de chá de baunilha
400g de mistura de frutos do bosque frescos ( framboesas, mirtilos e groselha)
200ml de natas + 1 colher de sopa de açúcar em pó
1 chávena de lemon curd


Bata as claras em castelo e depois adicione em chuva o açúcar. Bata até obter uma massa consistente, e adicione o vinagre, a baunilha e a maizena. Bata mais um pouco. Desenhe dois círculos em dois tabuleiros forrados a papel vegetal e divida a massa pelos dois círculos. Leve a forno pré-aquecido a 120º durante cerca de 1h.30m.
Bata as natas em chantilly juntamente com a colher de sopa de açúcar e reserve
Retire os merengues e deixe arrefecer completamente. Coloque um dos merengues num prato de servir e cubra com o lemon curd. Coloque o segundo merengue por cima e cubra com o chantilly e decore com os frutos vermelhos

* Receita da Pavlova, adaptada de Nigella Lawson





16 comentários:

Beth Martins disse...

Uma verdadeira tentação esses frutos ficarão 5* amei a receita, parabens pelo seu trabalho.

beijinhos

Maria disse...

Memórias boas de um outro tempo em que sonhava poder voar um dia.
Muitos anos depois ainda voo, mas só em pensamento...
Saio daqui a salivar. Este doce é bom demais!

Obrigada, Cristine.
Beijo.

mfc disse...

Era uma sala em que os sonhos dançavam um "pas de deux" gracioso e lindo!

Fê blue bird disse...

Uma maravilhosa memória, um doce que é uma tentação.
Tudo perfeito.


beijinhos

Vera Ferraz disse...

Perfeito, a história, a receita ... a fotografia!!

Parabéns pelo blog!!

Mar Arável disse...

Nunca se devem dobrar

nem as escadas

Boa memória em texto limpo

Anónimo disse...

A receita perfeita para acompanhar esta estória. Um encanto para ler e saborear.

bjs

Unknown disse...

Escreve-se muito bem por aqui...

Claudia Sousa Dias disse...

Este vou copiar!

Isabel J. disse...

Continua sempre a dançar com as tuas palavras, pois adoro! :*

Luis Eme disse...

que dança doce.

beijinhos Cristina

tiaselma.com disse...

O texto é primoroso. E essa doce foto abaixo...

Beijocas.

Sexy na Cidade disse...

quem bom aspecto!!!

Maria

margarida disse...

Assim à primeira vista, parece muito bem, mas depois reparo que é pavlova ( como eu detesto estas coisas arraçadas de suspiro), e depois lemon curd...andei desejosa de lemon curd semanas e semanas, depois de trifle com lemon curd e limoncello...e hoje de manhã acordei e enterrei-me em banhos marias e mexer até mais não, e tive a maior desilusão culinária dos últimos anos...a meio, dupliquei a dose de açucar, mas o lemon curd continua intragável, só sabe a uma mistura de molho que o meu sogro usa para pincelar o frango assado e a uma boca cheia de limões azedos...

CNS disse...

Olá Margarida

A única explicação que posso encontrar para tamanho desastre de azedo de limão, será a própria acidez dos limões que utilizou. Pois 400g (uma vez que diz que duplicou a dose) de açúcar para 120ml de sumo limão é uma proporção que só pode mesmo resultar num lemon curd dulcissimo!

Outra ressalva que faço é perguntar-lhe se quando raspou a casca de limão, teve o cuidado de raspar apenas o vidrado ou se raspou também a parte branca, uma vez que esta é extremamente amarga.



margarida disse...

Só pode ter sido do limão, e a raspa terá sido inocente.

De aspecto e consistência, ficou bom, bonito, sem grumos.

Vou voltar ao mingau ( o que desde sempre a minha mãe fez, e a que sempre chamámos este nome, que não são mais que papas de farinha maizna, leite, ovo, açucar e casquinha de limão).

E sempre há o molho que a sogra faz, com água e açucar em ponto de pérola e gemas, delicioso, translúcido, que arranha de doce na garganta...