A cozinha tinha um cortinado com flores azuis, pendurado por um esticador retorcido numa das pontas. Havia um bolo de ananás que cheirava a anos 50 e a recordações do outro lado do hemisfério. Chegavas às Sextas-feiras vestida na tua farda castanha. Eu, no meu mundo aparentemente sem fardas mas tão cheio de regras, abria-te a porta (quero imaginar com um sorriso, porque quando escrito o sorriso tem sabor de metáfora). Vinhas de um mundo estranho, de aparente clausura. Sentávamo-nos na contra-luz da porta que dava para a varanda, comíamos bolo e crescíamos a ser aquilo que esperavam de nós. Eu abria-te as páginas a preto e branco do livro de receitas sem capa que a minha mãe guardava no móvel da sala. O mundo a preto e branco das nossas mães era longínquo com o bafio absurdo do que nunca seria. Pensas demais, dizias enquanto dançavas com gestos teatrais à volta da mesa da sala. Passou mais uma sexta feira e lembrei-me de ti. Quis que tocasses à campainha do meu segundo andar que agora é um rés-do-chão do que é suposto. E servia-te uma fatia de bolo, que no meu silêncio contido, é como quem diz: fazes-me falta.
Bolo Piña-Colada
1 lata grande de ananás em calda
200g de manteiga
200g de açucar
150 g de farinha
100g de coco ralado
50 ml de rum anejo
5 ovos inteiro
Caramelo q.b
Unte uma forma redonda com manteiga. Faça um caramelo com 1 chávena de açucar e ½ chávena de agua e cubra as paredes da forma com este caramelo. Escorra as fatias de ananás e forre a forma com as mesmas.
Bata a manteiga com o açucar, junte o os ovos e depois o rum e o coco. Adicione cuidadosamente a farinha.
Leve a forno pré-aquecido a 160º durante cerca de uma hora
Adaptado de Receitas da TV, Maria de Lurdes Modesto.
Esta estória de ler e de comer, inserem-se na 2ª edição do desafio:Convidei para jantar a decorrer nos gourmets amadores. E a convidada foi a Maria de Lurdes Modesto
9 comentários:
Parece delicioso!
olá!
Na minha casa reinava o Mestre Silva, da D. Maria de Lurdes Modsto n me lembro dos programas, mas temos o grande livro da cozinha tradional portugesa e é de lá que tiramos mts receitas para o nosso Natal.
Este teu bolo marca tb a minha infância, e ainda é uma das especialidades da minha tia.
Um dia destes faço-o aqui em casa, só para mim..eu ADORO doces, e senhoras redondinhas, são as mais charmosas.
bjs e obrigada por teres mais uma vez participado de forma tão bela neste passatempo.
Ana, eu também nunca vi os programas da Maria de Lurdes Modesto, que passaram na década de 50 e 60. Mas a minha mãe tinha o livro, bem velhinho, que acabou por ser o meu primeiro livro de culinária.
Há sempre algo que ficou perdido ao longo da vida... e nada melhor que um docinho para atenuar a acidez da memória.
lembro-me que a minha mãe fazia esse bolo muito bem.
Agora há uma pastelaria que o vende. Caseiro. Delicioso.
Csd
Cristina,
Uma deliciosa história e um bonito bolo para uma Senhora. A receita não faz parte dos meus sabores de infância e só passei a interessar-me pela extraordinária contribuição de Maria de Lourdes Modesto para a gastronomia nacional muitos anos depois. A tua participação é uma excelente forma de a reconhecer. Obrigada!
Um beijo*
Estou a pensar fazer esta receita, pois a fotografia (bem como o texto) deixaram-me encantada. Só tenho uma dúvida, a farinha que usa leva fermento ou este bolo não leva, de todo, fermento? Obrigada
Olá Dulce
Sim, leva ( tenho de acrescentar na lista de ingredientes). 1 colher de chá.
Muito obrigada ;)
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